J. Bras. Nefrol. 2005;27(2 suppl. 1):18-21.

Tratamento da Nefropatia por IgA

A Nefropatia por IgA (NIgA) é considerada uma das formas mais freqüentes de glomerulopatia primária no adulto, com grandes variaçoes em sua distribuiçao geográfica. É definida do ponto de vista histológico pela microscopia de imunofluorescência, que mostra a presença dominante ou co-dominante de depósitos da imunoglobulina A no mesângio glomerular. A forma de apresentaçao clínica mais freqüente é de hematúria macroscópica após episódios de infecçao, embora possa apresentar-se com hematúria e proteinúria assintomática, e menos freqüentemente com hipertensao arterial, síndrome nefrótica e insuficiência renal. A evoluçao clínica é extremamente variável, sendo benigna na maioria, embora insuficiência renal terminal possa desenvolver-se lentamente em 20 a 30% em 10 a 20 anos. A lesao histológica mais comum da NIgA é a glomerulonefrite proliferativa mesangial segmentar e focal ou difusa, com vários graus de expansao da matriz mesangial e de proliferaçao celular, podendo superpor-se outras lesoes como glomerulosclerose segmentar e focal, infiltrado inflamatório intersticial e crescentes epiteliais. Na forma crônica, observam-se glomérulos escleróticos e fibrose túbulo-intersticial. Sendo a evoluçao lenta, é importante identificar possíveis fatores de risco para progressao, citando-se: reduçao da funçao renal, intensidade e duraçao da proteinúria e hipertensao arterial. Alguns autores consideram também a idade mais avançada no início da doença, o sexo masculino, a presença de hipertrigliceridemia, hiperuricemia e o aumento da excreçao urinária de proteínas de baixo peso molecular. As alteraçoes histológicas sao melhores indicadores prognósticos, sendo as principais: a intensidade de esclerose glomerular, fibrose intersticial e atrofia tubular, o grau de expansao e proliferaçao mesangial, crescentes epiteliais em grande número, e a presença e intensidade das lesoes arteriolares.

Nao há tratamento específico; embora tenham sido investigadas diversas abordagens, nenhuma delas tem-se mostrado realmente efetiva a longo prazo. O tratamento deve ser individualizado, considerando o quadro clínico, a lesao histológica e a presença de fatores de risco para progressao.

Recomendaçao 1

Há indícios de que se deve iniciar uso de inibidores de enzima conversora de angiotensina (IECA) e/ou bloqueadores de receptor de angiotensina II (BRA) diante de proteinúria persistente.

Recomendaçao 2

Recomendaçao 3

Recomendaçao 4

Comentários – Rec. 3 e 4: Busca-se reduzir a pressao arterial para 125/75 mmHg e proteinúria para níveis < 0,5g/dia (Grau D)(1).

Estudo prospectivo e randomizado com acompanhamento de 6 anos mostrou que os IECA melhoram a sobrevida renal de pacientes com proteinuria > 0,5g/dia e funçao renal normal ou moderadamente reduzida(2).

Outro estudo randomizado e prospectivo, comparando losartan com amlodipina, mostrou que embora ambos tenham reduzido os níveis pressóricos para valores semelhantes, o losartan reduziu a proteinúria(3).

O estudo COOPERATE, prospectivo e randomizado, analisando 263 pacientes proteinúricos (metade com NIgA), encontrou maior sobrevida renal e reduçao da proteinúria com a associaçao de IECA + BRA (com metade das doses) comparado com monoterapia em dose plena(4).

Recomendaçao 5

Comentários – Rec. 5: De uma maneira geral, corticóide tem sucesso variável. Estudos controlados e nao-controlados sugerem que, no adulto, o tratamento prolongado (4 a 6 meses) diminui a proteinúria (Grau B), mas ainda nao está comprovado se previne a progressao a longo prazo (Grau C).

Metanálise de estudos controlados comparando corticosteróides com placebo, mostrou que os corticosteróides foram associados com menor proteinúria e menor risco de evoluçao para insuficiência renal crônica(5). No entanto, doses baixas de corticóide VO nao têm sido efetivas nesses casos (6).

No esquema alternativo, mais agressivo, proposto por Pozzi, de pulsoterapia com metilprednisolona 1g/dia EV por 3 dias no 1º, 3º e 5º meses, mantendo prednisona VO 0,5 mg/kg em dias alternados, nao foram descritos efeitos colaterais de maior gravidade(7).

Nao há evidências de que os tratamentos citados sejam efetivos quando a perda da filtraçao glomerular é maior que 50 % a 60%.

Recomendaçao 6

Recomendaçao 7

Comentários – Rec. 7: Estudo prospectivo e randomizado utilizando citostáticos com corticóide por 2 anos mostrou maior sobrevida renal que os controles, embora a resposta tenha sido heterogênea e diretamente proporcional aos valores iniciais da creatinina sérica(8).

Estudo prospectivo e randomizado, com pequeno número de pacientes utilizando MMF 2g/dia, e acompanhados por 3 anos, nao mostrou nenhum efeito na progressao da doença ou na proteinúria(9).

Pacientes com algum grau de insuficiência renal e evoluçao lenta e progressiva, o tratamento é mais controverso. Têm sido utilizado o óleo de peixe Omega-3, com poucos efeitos colaterais, embora sua efetividade ainda nao esteja comprovada, e haja necessidade de utilizaçao por tempo prolongado. Meta-análise do efeito do óleo de peixe Omega-3, nao mostrou efeito significante, embora sugerisse que possa ser efetivo quando utilizado por mais de 2 anos e em pacientes com proteinúria acentuada(10).

Recomendaçao 8

Comentários – Rec. 8: Nao há estudos controlados devido a menor freqüência desta forma de apresentaçao da N. IgA, e pela gravidade da doença.

Estudo aberto prospectivo de 12 pacientes com NIgA crescentica mostrou que o tratamento com pulsoterapia com metilprednisolona seguida de prednisona oral, associada a ciclofosfamida intravenosa mensal, estabilizou a funçao renal, reduziu a proteinuria e reverteu a proliferaçao endocapilar e os crescentes glomerulares após 6 meses(11).

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

1. Dillon JJ: Angiotensin-converting enzyme inhibitors and angiotensin receptor blockers for IgA nephropathy. Semin Nephrol 24:218-24,2004.

2. Praga M, Gutierrez E, Gonzalez, et al: Treatment of IgA nephropathy with ACE inhibitors: a randomized and controlled trial. J Am Soc Nephrol 14:1578-83,2003.

3. Park HC, Xu ZG, Choi S, et al: Effect of losartan and amlodipine on proteinuria and transforming growth factorbeta1 in patients with IgA nephropathy. Nephrol Dial Transplant 18:1115-21,2003.

4. Nakao N, Yoshimura A, Morita H, et al: Combination treatment of angiotensin-II receptor blocker and angiotensin-convertingenzyme inhibitor in non-diabetic renal disease (COOPERATE): a randomized controlled trial. Lancet 361:117-24,2003.

5. Samuels JA, Strippoli GFM, Craig JC, et al. : Immunosuppressive agents for treating IgA nephropathy (Cochrane Review). In: The Cochrane Library, Issue 1. Chichester UK: John Wiley & Sons Ltd, 2004.

6. Katafuchi R, Ikeda K, Mizumasa T, et al: Controlled, prospective trial of steroid treatment in IgA nephropathy: a limitation of low-dose prednisolona therapy. Am J Kidney Dis 41:972-83,2003.

7. Pozzi C, Andreolli A, Del Vecchio L, et al: Corticosteroid effect iveness in IgA nephropathy: Long results of a randomized controlled trial. J Am Soc Nephrol 15:157-63,2004.

8. Ballardie FW, Roberts ISD. Controlled prospective trial of prednisolone with cytotoxics in progressive IgA nephrophathy. J Am Soc Nephrol 13:142-8,2002.

9. Maes BD, Oyen R, Claes K, et al: Mycophenolate mofetil in IgA nephropathy: results of a 3-year prospective placebocontrolled randomized study. Kidney Int 65:1842-9,2004.

10. Dillon JJ: Fish oil therapy for IgA nephropathy: efficacy and interstudy variability. J Am Soc Nephrol 8:1739-44,1997.

11. Tumlin JA, Lohavichan V, Henniger R: Crescentic, proliferative IgA nephropathy: clinical and histological response to methylprednisolone and intravenous cyclophosphamide. Nephrol Dial Transplant 18:1321-9, 2003.

Tratamento da Nefropatia por IgA

17.430

Comentários